segunda-feira, 28 de julho de 2008

Convergências e controvérsias entre Brasil e Argentina

Visitando Buenos Aires, fiquei encantado com a cidade, seu conjunto arquitetônico, os grandes e múltiplos parques. Não se pode deixar de concluir que ela é eminentemente européia na sua expressão física e no biotipo da maioria dos seus habitantes. A arquitetura lembra muito, e certamente, é cópia da de Paris. Os sobrados, solares, verdadeiros palácios, são encimados por ardósia ( ou algum material que a ela se assemelhe). De qualquer forma, isso significa um apogeu econômico quando foram construídos. A guia nos informou que muitas famílias, viajando à Europa, no século XIX, Paris, Barcelona, cidades da Itália, de lá tiraram inspiração para aquela arquitetura que dá às avenidas um ar de “ boulevard “ , ainda enriquecida pela presença de inumeráveis plátanos. Há o famoso café Tortoni, do 1858, que é um dos pontos que não se pode deixar de visitar, e nesse período de férias, temos que esperar na fila ( e no frio) para podermos ter acesso – mas entrando lá, vemos que vale a pena ter esperado.
O povo argentino é conhecido pelo quase fanatismo relacionado ao futebol – e daí vêm as nossas controvérsias. A guia disse que não poderia deixar de nos mostrar o estádio do Bocca Junior, que está ao lado do bairro ocupado pelos italianos imigrantes, onde Maradona é rei. Na área chamada “Caminito” há uma concentração das antigas moradias ocupadas por eles e que hoje, todas pintadas e coloridas ( é um pequeno Pelourinho), são apresentadas como um dos “points” turísticos.
De qualquer forma, o argentino – pelo menos o que vi em Buenos Aires – tem um espírito de reivindicação que nos faz inveja. Todos os dias havia alguma manifestação, seja na Casa Rosada como no Congresso, alem de manifestações pelas ruas e avenidas.
Na Praça de Maio ocupa um lugar de destaque a Catedral que tem como Padroeiro a própria Santíssima Trindade. Lá encontra-se o mausoléu de San Martin, o herói libertador da Pátria. Ele, em 25 de maio de 1810, já elaborou os primeiros passos para a independência, pois o povo não aceitava ficar sob o jugo de Napoleão que dominava a Espanha – diziam que já não aceitavam um rei espanhol e muito menos, agora, um francês. As idéias libertárias se consolidaram no dia 9 de julho de 1916 – é um dia de feriado e corresponde ao nosso 7 de Setembro. Mas estranhei por não presenciar desfiles e paradas militares. Mas me responderam que como o povo já está muito desiludido com os políticos, não haveria público para aplaudir essas festas cívicas – por isso, o dia é apenas um feriado nacional.
Perguntando sobre qual o título mariano que prevalece na cidade e no país, fui informado sobre a devoção a Nossa Senhora de Lujan, que fica a uns 70 km fora de Buenos Aires e que é o santuário nacional ( como aqui é Aparecida).
Apesar das inevitáveis divergências no futebol, há algo muito em comum entre esse país e o Brasil,na origem dessa devoção. E fui lá, com minha mãe, para conhecer esse santuário
A história está contada num grande painel localizado ao lado do altar-mor na basílica, que é neo-gótica e que imita, em proporções bem menores, a Notre Dame de Paris- foi construída em 1896.
Tudo começou em 1630, quando um fazendeiro português, que lá morava, quis ter na sua casa de campo uma imagem de Nossa Senhora. Nessa época estava em voga a confecção de imagem em terracota em S. Paulo. Há várias imagens desse material e mais ou menos nesse estilo, nessa época. A maioria veio de Portugal no século XVII. Mas, aos poucos, os artistas surgiram no Brasil Temos os grandes representantes dessa época que são Frei Agostinho da Piedade, Frei Agostinho de Jesus e Domingos Conceição da Silva. Há exemplares desses três artistas em S. Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Olinda.
Esse fazendeiro português que possuía terras em Summampa encomendou em S.Paulo uma imagem de Nossa Senhora , para ser colocada em sua casa. As imagens foram enviadas em carros de boi. Ao cabo de dois dias elas já estavam nas terras do referido senhor, isto é, às margens do rio Lujan. O fato inusitado é que a carroça que transportava as imagens e outros objetos, antes de chegar ao seu destino, não conseguia avançar. Tiraram todas as caixas e as cargas em geral. Logo a carroça se movia, mas quando as cargas eram colocadas, repetia-se o fato. Isso aconteceu várias vezes. Foram retirando os pacotes um a um. Perceberam que quando, precisamente, um deles fora retirado, a carroça se movia, mas se era novamente colocado, ela emperrava. Ao abrirem o pacote, descobriram que era exatamente a imagem de Maria. Logo perceberam que a Mãe queria ficar ali naquele local. O texto no santuário diz que “assim se produziu o milagre de Lujan : Maria havia decidido onde queria permanecer para receber seus filhos e escutar suas súplicas”.
Dessa forma, o santuário oficial da Argentina é muito visitado, é lugar de peregrinação e, sem falsos nacionalismos de nossa parte, mas, talvez, para mostrar que Maria é a Mãe de todos, os nossos vizinhos argentinos têm como Padroeira, uma imagem brasileira que até lembra a nossa de Aparecida, pois é negra, pequena e tem o mesmo manto. Conforme a história lida lá, por trás do manto há um revestimento de prata para melhor preservá-la.
Dessa forma, Maria está presente no coração do povo argentino como aquela que foi dada a João Evangelista como a Mãe de todos :”Filho eis tua Mãe, Mãe eis o teu filho”. Para o evangelista João, Maria é um dom de Deus aos homens e mulheres de todos os tempos e lugares e que personaliza a própria Igreja que deve ser um abrigo de todos, sobretudo dos mais necessitados.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

A INICIAÇÃO E A BUSCA DE NOVOS VALORES

A INICIAÇÃO E A BUSCA DE NOVOS VALORES



A iniciação está presente em todo tipo de sociedade, e abrange vários níveis da vida humana, muitas vezes sendo difícil até distinguir onde termina um elemento e começa outro. Desse modo, o social, o religioso, o econômico e outros aspectos pertinentes se interligam e dependem mutuamente. Nesse sentido, as instituições básicas e clássicas da sociedade, não apenas ocidental, isto é, a família, a religião e a escola (academia), são os canais naturais de transmissão de valores para as novas gerações.
Mas o fato, facilmente constatável da necessidade de iniciação nas diversas sociedades humanas está hoje ameaçado, sofre um processo de crise, de ruptura, e ameaça a transmissão de valores para as gerações mais jovens, que, por isso mesmo, se sentem sem rumo, em busca de novos valores em que se apóiem.
Evidentemente que há várias razões para isso. Em contraste com a sociedade antiga que baseava a transmissão dos seus valores a partir da necessidade de uma iniciação, na sociedade moderna, o que predomina é a auto-iniciação, é o aprendizado imediato das coisas. Aprende-se algo para fazer alguma coisa com aquilo que se aprendeu. É a sociedade pragmática, utilitária, que leva as pessoas a uma mentalidade descartável da vida: tudo é ou não utilizável, até as pessoas. Nas sociedades de pequena escala ainda subsistem as iniciações, apesar da presença do homem branco, nessas sociedades, constituir-se sempre uma ameaça.
O que mais caracteriza a nossa sociedade, no sentido de trazer inquietações, é que ela não vê com clareza o que quer transmitir. Aí está a raiz da crise da iniciação no nosso tempo. Na verdade, a iniciação é portadora de elementos que constituem as diversas sociedades, pois sem transmissão de valores não há continuidade.
O próprio fato da crise de iniciação na nossa sociedade gera, em contrapartida, a necessidade de novas iniciações e de novos ritos de passagem, pois persiste sempre a necessidade de ritos iniciáticos, que subsistem sob formas não institucionalizadas, informais.
As sociedades humanas são marcadas pela institucionalização da cultura. Isso porque ela é o instrumento de transmissão dos meios de sobrevivência, seja dos indivíduos, seja da sociedade. Como o homem, ao nascer, é dependente de tudo, tem necessidade de ser educado, de receber um patrimônio construído pelos outros, para que possa se inserir no seu contexto. Como hoje há um certo deslocamento de tarefas, com relação à missão dos tradicionais agentes formadores, a formação tem passado para outras instâncias que escapam ao controle das camadas dominantes. Isso gera, naturalmente, uma tensão entre a educação formal e a informal. Nem sempre os estudiosos do assunto vêem essa tensão como algo negativo, mas consideram que ela pode ser sinal de uma busca e, sobretudo, de recomposição de novos valores.

A própria crise da iniciação leva a pessoa e a sociedade quase a “fabricarem” novos ritos de iniciação. É como se o grupo quisesse reforçar a coesão, as normas, interiorizar suas regras pelos novos que vão chegando e permitir, de alguma forma, que aquele que aceita a regra do jogo (daquele grupo ou sociedade) aceite se religar a uma história contínua e ser depositário de uma memória da qual será transmissor.
Essas dificuldades atingem as pessoas individualmente e como grupo social; atingem a religião como um todo, o cristianismo, o catolicismo e outras expressões religiosas; as famílias religiosas não sabem como iniciar as novas gerações nos seus valores básicos, nos valores recebidos e vividos numa sociedade em mutação.
Persiste uma rejeição quase instintiva de tudo que é religioso ou que fale de Deus, sobretudo nas relações dos jovens com a fé cristã. É inegável o esforço de muitos líderes religiosos, através de manifestações oficiais e de documentos emitidos para um diálogo mais próximo.
Nesse contexto, é apresentado o problema da ruptura com as tradições que traz como conseqüência uma perda de valores da memória coletiva. Nesse sentido, o trabalho é um interrogar aos cristãos, às pessoas de fé, sobre a sua missão: que tarefas têm os que crêem, quando eles próprios são confrontados com uma interrupção do fio da tradição cristã?

NOVOS RITOS DE PASSAGEM

Há certos gestos e objetos que são marcados pelo fenômeno da passagem: o primeiro talão de cheque, o primeiro carro, o computador, a abertura de uma conta bancária, etc. Mas eles não têm jamais função puramente simbólica. Têm também uma utilidade real.
O rito dos calouros pode ser considerado como uma autocelebração do grupo constituído. Nesse sentido, ele é um espelho em que se desvela o imaginário do grupo, através de funções instituídas, de comportamentos adotados e valores que contam “vantagem”.
O recurso à tradição, sobretudo nos períodos de tensão, torna-se um meio de reforçar as distâncias e as barreiras sociais. O recurso ao ritual tem também uma função de estabilização e de confirmação. Sob uma aparência momentaneamente descoordenada, ele permite uma mais rápida e melhor interiorização das normas do grupo pelos novos, reforça a coesão do grupo dos antigos, acelera o interconhecimento dos indivíduos e reitera a adesão (mesmo se ela se exprimir sob uma forma inversa) à ordem pedagógica e aos valores da instituição escolar. Ele permite àquele que aceita a regra do jogo religar-se a uma história contínua e tornar-se depositário de uma memória que será incumbido de transmitir. À cultura técnica, ao savoir-faire ensinado pela instituição, se sobrepõe um savoir-être, que é um comportamento emocional e afetivo produzido e controlado pelo grupo.
É revelador que essa iniciação (a do calouro) seja chamada de “batismo”. Ela é muitas vezes solene ou menos séria e comporta uma forte carga emotiva.
Nem a presença dos elementos religiosos num ritual com acentos tão profanos pode parecer uma contradição. Mas eles são característicos dessa “inculturação religiosa” que ainda impregna a nossa sociedade modelada pelo cristianismo. E, acima de tudo, eles introduzem a noção da consagração e de pertença a um grupo em formação.
O mundo religioso parece ter sido uma constante nesses rituais de calouros. Denise Berger, apoiando-se num conjunto de textos e estampas dos séculos XV ao XVIII, descreve vários itens de entronização de estudantes nas universidades européias, que se assemelham aos nossos ritos de calouros (Depositio). Ela estabelece claramente o simbolismo cristão do rito, que, sob a forma inversa da caricatura, apela a modelos religiosos. Há uma ressurreição celebrada pelo Batismo.
A relação estabelecida entre a mácula anterior e o renascimento ligado ao sacramento, a dimensão simbólica, assim como a terminologia empregada, reenviam claramente ao batismo religioso. Ele, o batismo, é um nascimento espiritual que apaga o pecado, confere a graça e abre a vida eterna ao cristão. Desse novo nascimento decorre, naturalmente, a ligação espiritual, que é diferente da relação de família, apesar de ela ser o modelo usado aqui; na verdade, a instituição do padrinho-madrinha foi sempre algo a mais que uma relação de família.
Através de uma violência teatralizada e representada como tal, a “calourada” marca uma passagem e esboça uma fronteira. Ela opera uma mudança de estado instrumentalizado por uma série de operações, um conjunto construído de atos sucessivos, que, primeiramente, separa o “noviço” do seu meio de origem, depois o remodela segundo outros critérios culturais, para, em seguida, agregar esse ser transformado a um novo grupo de afiliação, incluindo-o num parentesco escolar.
Hoje, aponta-se como um dos ritos de passagem do mundo contemporâneo, o chamado inserimento, isto é, a entrada de uma criança na escola maternal, na creche, ainda muito cedo, sofrendo todas as conseqüências de um mundo novo que ela enfrenta, participando, desse modo, de um tipo de iniciação.
Quando se olha a situação de transição em que a criança passa do universo maternal ao mundo novo da creche, desde o primeiro dia em que ela se sente mergulhada, percebe-se que a prática do inserimento comporta verdadeiros ritos de passagem que estruturam o que foi definido como uma “iniciação”. Essa iniciação é constituída de duas experiências complementares e opostas: ela ajuda a criança a se desligar de um meio e a se adaptar a um novo meio, a se separar de um e a se ligar a outro.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

USOS DO TERMO INICIAÇÃO

O termo iniciação tem diferentes aspectos e também vários campos de aplicação. Descobrimos que o processo de iniciação permanece uma realidade presente na sociedade contemporânea, mesmo se isso não é nela plenamente visível, à primeira vista. Ela corresponde a novas buscas, a novas expectativas que estão presentes nessa sociedade. O que entendemos por iniciação?
Podemos citar três usos do termo iniciação:
1º - Na sua origem, o termo diz respeito aos “mistérios” gregos e romanos. A pessoa passa por uma experiência religiosa que transforma seu ser e que lhe dá acesso à salvação. Os iniciados têm acesso aos “mistérios secretos” através de ritos. Entrar nesses “mistérios” é renovar a existência. Também existe o aspecto de integração ao grupo dos iniciados.
2º - Há também um outro aspecto que é o da cultura e religião. Nas sociedades e religiões primitivas, tradicionais, as crianças, chegando à puberdade, são introduzidas no mundo dos adultos através de provas, ritos e ensinamentos orais. Essa iniciação tem como fim modificar radicalmente a condição social e religiosa da pessoa iniciada.
3º - Enfim, num sentido mais atual, independentemente de todo contexto religioso, fala-se de iniciação para designar o processo de aprendizagem e de socialização. Nesse caso, iniciação significa uma introdução progressiva, seja ao conhecimento de uma teoria, de uma doutrina, seja à prática de uma técnica, de uma disciplina, de um ofício. Nesse sentido, a iniciação tem um âmbito restrito: pode-se ser iniciado em pintura, em informática, em matemática. Num sentido mais largo, fala-se igualmente de iniciação para significar o processo pelo qual uma pessoa aprende a se apropriar existencialmente das normas, dos valores, dos comportamentos, das atitudes e dos hábitos de um grupo social. Ela não se limita àquilo que se entende por educação ou formação. Ela toca na pessoa, no seu ser, na sua maneira de ser. Por isso ela é mais que a simples aprendizagem de uma técnica ou de um saber.
A iniciação é expressão privilegiada do drama da existência. Ela é o protótipo mesmo do percurso da morte à vida. Ela é inerente à condição humana. Habita todo o homem e estrutura sua personalidade profunda. Ela se encontra ancorada solidamente no mais profundo do imaginário humano, do indivíduo e dos grupos. Não nos espantamos ao encontrá-la em múltiplos domínios, sobretudo na nossa época em que o corpo social, no seu conjunto, está em mutação permanente.
Através da passagem ritual de iniciação, está em jogo uma busca de identidade. Não se trata somente de adquirir conhecimentos intelectuais e de técnicas de aprendizagem para viver. Mais profundamente, o ser humano tem necessidade de um saber-ser. Deseja se conhecer e se situar na sociedade. Para ser reconhecido, ele deve aceder a um certo status social, que implica em instâncias, isto é, numa identidade existencial, numa identidade familiar e numa identidade social (como me integrar no grupo?).
Cada iniciado é conduzido a tomar posição e a trabalhar o campo de suas relações. Podem-se distinguir as relações primárias fundadas sobre as diferenças biológicas de sexo: homem/mulher; de idade: velho/novo; de pertença étnica: estrangeiro/autóctone; e também dominante/dominado (relações construídas a partir da repartição das riquezas, do poder, do saber).
A escola e a família que são objetos da mais forte institucionalização social, são cada vez mais concorridas por instâncias de socialização, deixando grande espaço para aquilo que se poderia chamar de iniciação informal.
Será que os ritos de passagem hoje desapareceram ou se transformaram? Numa sociedade que evolui rapidamente, como a nossa, os ritos organizados num período anterior, tornam-se logo velhos, ultrapassados.
Mas, apesar de uma crise de iniciação que marca nossa sociedade, pode-se dizer que há uma persistência do processo iniciático sob formas não institucionalizadas: a primeira comunhão, a comunhão solene (presente em muitos países da Europa), os retiros, o escotismo, os 15 anos, o vestibular, etc. O etnólogo Pasquier diz que o processo iniciático de nossa sociedade continua a desafiar o nosso imaginário coletivo. Na verdade, ele não é mais institucionalizado. Todavia, muitas vezes faz nascer uma procura espiritual determinada, desligada das formas iniciáticas estabelecidas e conhecidas.

São Paulo e São Pedro - colunas do cristianismo

No rico ciclo junino, que termina com a festa de S. Pedro, figura central na expansão do cristianismo nascente, a pessoa de S. Paulo, que na Liturgia é celebrado juntamente com o Chaveiro dos Céus, no dia 29 de junho, não entrou no ciclo das devoções populares de junho.
Pedro é o discípulo-apóstolo tão ardoroso quanto fraco. Todos nos lembramos do que Cristo lhe disse :”Pedro, antes que o galo cante, tu me negarás”. E de fato, isso aconteceu. Mas nem por isso ele deixou de ser o depositário da confiança do Senhor para ser o Pedro-pedra, sobre a qual ( pedra) Ele edificou a sua Igreja. Por sua fé e humildade será chamado a confirmar a fé dos seus irmãos.
S. Pedro, que conforme a tradição dos Evangelhos, foi o apóstolo escolhido para ser o irmão-pastor da comunidade, e numa linguagem posterior, é chamado de o 1º Papa, é festejado com outro apóstolo que tem importância capital para a expansão do cristianismo. Os dois são considerados como as colunas mestras nessa nova arquitetura de Deus que é a Igreja/Templo vivo que Cristo quis edificar.
De acordo com a história da Liturgia, essa festa dos dois apóstolos, foi incluída no Santoral Romano já antes da festa do Natal. No século IV já eram celebradas três missas em homenagem a esses santos: uma em S. Pedro no Vaticano, outra em S.Paulo Fora dos Muros (onde estão as relíquias desse santo) e outra na Catacumba de S. Sebastião. Diz a tradição que na época das perseguições aos cristãos prolongadas até o início do IV século,as relíquias desses dois apóstolos ficaram escondidas naquela catacumba, até que viesse a era constantiniana.
Mas Paulo tem o destaque de ser o cabeça-pensante, aquele que elaborou, por primeiro, o corpo doutrinal do pensamento do cristianismo. Ele é, por excelência, o missionário impetuoso, que rompe as fronteiras do judaísmo e proclama a Boa Nova a todos os povos. Ele é o apóstolo que melhor aprofunda aquilo que a teologia chama de o “mistério “ de Cristo.
O pensamento de Paulo está conservado nas suas epístolas, que constituem aquilo que se chama de “o corpo Paulino”. Suas treze epístolas, designadas pelos destinatários ou comunidades a que ele se dirigia, são classificadas não pela ordem cronológica, mas pelo comprimento decrescente. Entre as epístolas, há aquelas ditas do cativeiro (Filipenses,Colossenses e Filemon), sem precisar qual foi o cativeiro, pois ele esteve preso por diversas vezes. Há também as epístolas pastorais – de Timóteo e Tito – que são assim chamadas por serem instruções aos pastores das jovens igrejas.
É conhecido o lugar do pensamento de Paulo na elaboração do pensamento cristão. E sua pessoa se encontra simbolizando o encontro de três culturas – a judaica, a romana e a cristã – que marcarão a difusão do cristianismo.
Ele nasceu na Ásia Menor, entre 5 e 15 da era cristã de uma família zelosa, e ele próprio, como fariseu, recebeu uma sólida formação em Jerusalém, falava grego, e através de sua família, beneficiou-se do título de Cidadão Romano. Convencionou-se celebrar o bimilenário de nascimento de Paulo de 2008 a 2009. Ele não conheceu Cristo pessoalmente. Em Jerusalém fez parte do grupo dos judeus dos mais hostis aos cristãos e os perseguiu sem descanso, com convicção de estar prestando um grande bem à Lei antiga – ele assistiu e aprovou o martírio de Estevão, considerado o primeiro mártir da era cristã. Mas é exatamente em Damasco, onde estava à cata de cristãos para prendê-los, que ele, pelo ano 38, é jogado por terra por uma força invencível que lhe diz :”Saulo, Saulo, por que me persegues ?”. Dessa forma, ele recebeu uma revelação que o tornou um dos mais ardentes discípulos de Cristo .
Toda a teologia de Paulo decorre do caminho percorrido em Damasco. “Quem és tu Senhor?”. E Cristo lhe responde :”Eu sou Jesus a quem tu persegues”. Sobre esse caminho ele identifica Jesus como o Filho de Deus, como o Messias prometido. Ele compreende que a Lei o havia tornado cego para entender a verdadeira vontade de Deus. E essa visão vai ser transportada para a sua teologia : identificar os cristãos, os irmãos, com Cristo.
Hostilizado de um lado pelos judeus e do outro lado pelos cristãos de origem judaica, ele foi conduzido àqueles que estavam mais longe do cristianismo, aos pagãos que os judeus chamavam de os gentios – por isso, ele é chamado de “O Apóstolo dos Gentios”.
Independente de sua obra teológica, o balanço da sua ação missionária é considerável. Ele multiplicou e consolidou as Igrejas da Ásia Menor (Galácia, Éfeso) e contribuiu fazendo com que o cristianismo penetrasse no Ocidente, alem de evangelizar as grandes cidades da Grécia, como Filipos, Tessalônica, Colossos. Mas sofreu hostilidade em Atenas e também em Roma. Ele morreu em Roma entre 67 e 68, provavelmente, pouco após Pedro. Eles são venerados em conjunto e foram considerados como “as colunas centrais da Igreja” já pelo Papa S. Clemente, em 95.
O cristianismo, sob as suas diversas formas históricas , necessita sempre retomar a mensagem e atuação desses dois Apóstolos, voltar à primeira pregação, pois ela é modelar para renovar a visão e a busca do sagrado nos nossos dias.